“Terceirização”: A Burla ao Concurso Público

A terceirização, entendida como a contratação de mão de obra por uma empresa com a interposição de uma pessoa jurídica na relação, era uma prática em crescimento no final dos anos 80 e início dos 90. A modalidade era adotada tanto pelas empresas privadas, que viam nesta opção a possibilidade de redução de custos com mão de obra, quanto pelos órgãos públicos, que a adotavam como meio fácil de suprir as suas necessidades de pessoal.

Com a promulgação, em 1988, da nova Constituição Federal, cujo inciso II, do art. 37, exigia que o preenchimento dos cargos e empregos públicos fosse feito através de concurso, esperava-se que houvesse um freio a esta prática no serviço público, onde uma adequada interpretação da norma constitucional impediria que as necessidades de mão de obra fossem supridas pela “terceirização”. A contratação de trabalhadores para a prestação de serviços públicos, sem sua aprovação prévia em concurso, nada mais é do que uma burla ao preceito constitucional, que se justifica pela impessoalidade e igualdade de oportunidades a todos os cidadãos.

Infelizmente, o que se viu foi exatamente o contrário: agora afastado o risco de que o trabalhador viesse a ser reconhecido como empregado da Administração, os órgãos passaram a, cada vez mais, utilizar-se da contratação de trabalhadores por meio de empresas prestadoras de serviços. Assim, atendem às suas necessidades de pessoal, sem se submeterem ao oneroso e demorado processo de seleção por meio de concurso público.

Esta atitude vem em prejuízo do próprio órgão público, que passa a ter suas atividades desenvolvidas por pessoas que não foram selecionadas por sua capacidade técnica e aptidão e dos trabalhadores que, assim, restam “erigidos” à duvidosa condição de servidores públicos de 2ª categoria, freqüentemente realizando o trabalho a par dos servidores admitidos por concurso público, porém, sem receberem os mesmos salários, benefícios e garantias.

Prejudica, por igual, o cidadão que aspira a ingressar no serviço público, pelos meios regulares e que, freqüentemente, já prestou e foi aprovado em concurso, mas que não é investido no cargo, pois o trabalho que iria realizar já está sendo desempenhado, de forma mais barata, pelos “servidores de segunda”.

Finalmente, esta prática acaba determinando prejuízo à sociedade, que vai receber um serviço prestado por um funcionário que não tem compromisso final com o resultado do seu trabalho e que, por vezes, não tem o preparo necessário para o desempenho da função que lhe foi atribuída. É necessário, portanto que os Tribunais, ao interpretar a Constituição, coibam a deturpação e a má utilização da “terceirização” pelo administrador público.

 

João M. Catita
Advogado trabalhista e sócio da Camargo, Catita, Maineri, Advogados Associados